terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O OLHAR EX/ÓTICO DO ESTRANGEIRO SOBRE A LITERATURA E O CINEMA PERNAMBUCANOS NA CONTEMPORANEIDADE.
Os primeiros lampejos de comunicação literária do Brasil com Europa foram dados no início do século XIX com o Romantismo. Autores como José de Alencar, Joaquim Manoel de Macedo, Álvares de Azevedo, entre outros, representaram fielmente os cânones (mesmo o Romantismo na Europa sendo uma escola literária desconstituída de regras) dos escritores europeus. Embora estivéssemos nessa época lutando pela nossa independência política, no ramo cultural essa certa independência só viria a acontecer com “Memórias Póstumas de Brás Cubas” de Machado de Assis. Antes disso, o escritor brasileiro costumava parafrasear as obras européias com um cheiro de palmeira imperial e com o cantar de sábias com sotaque francês. E isso era o que chamava a pouca atenção dos muito poucos ainda leitores de além-mar. O exótico brasileiro é que lhes atraía à leitura de textos brasileiros. Mas não o exótico como entendemos hoje, e sim, como fora do olhar convencional. A cultura européia estava acostumada com um tipo de signos literários que mais ou menos se tornou via de regra na roda de leitores daquele período.Durante muito tempo permanecemos com essa visão de submissão aos olhares europeus. Não muito distante de nós, no século XX, Jorge Amado mostrava tudo (que para ele) tinha de melhor na Bahia, resultado: Esse tipo de Literatura foi consumida até a morte na Europa. E o que mais pode intrigar é que por essa Literatura a nossa identidade cultural ficou marcada pela malandragem, irreverência, e certa ingenuidade no modo de enxergarmos o mundo, aquela mesma ingenuidade do tempo do desembarque das caravelas. Além desse ramo da Literatura brasileira, a crescente indústria cinematográfica também vendia essa imagem de oba-oba da cultura brasileira. A porno-chanchada foi muito marcante nas décadas de 30/40 do século passado, com temas geralmente que exploravam a malandragem do brasileiro contribuindo ainda mais para que o olhar do estrangeiro sobre nossa cultura permanecesse procurando o ex/ótico. Com o período ditatorial (até isso importamos da Europa) o nosso poder de reflexão sobre o mundo e a condição humana ficou restrito aos guetos universitários e aos centros undergrounds culturais mais influentes, isso contribuiu em meados da década de 1980, com a redemocratização, a cultura depois de tanto “silêncio” conseguisse re/inventar a identidade nacional e imprimir uma nova visão aos olhos internacionais. Feito isso, a cultura contemporânea não poderia ter outro pano de fundo se não a crítica. Crítica de costumes, de influências, da repressão, da violência e inclusive, mas não sobretudo, a crítica à submissão, desta feita não só aos olhos externos , mas também aos internos. Isso fica mais evidente com a produção cinematográfica do início dos anos 1990. Filmes como “Cidade de Deus” ‘“Olga” e “Agosto” tentaram re/construir e criticar, porém, sem ser dedos-duros, toda uma geração silenciada na construção dessa identidade cultural. A Literatura também nos mostra essa fase de reconstrução da cultura brasileira. A intenção da grande parte dos escritores contemporâneos ainda é a crítica aos problemas sociais que o Brasil atravessa há séculos, mas também mostrar outra cara ao Brasil, isto é, conceder universalidade a temas aparentemente brasileiros. Entretanto, vez por outra, o tema do eterno colonizado re/aparece em algumas manifestações artísticas. Por outro lado,agora com uma nova roupagem, com uma crítica à submissão às avessas, uma crítica ex/ótica. É incontestável que ainda figuramos no olhar do estrangeiro como um povo voltado à carnavalização, e aí se inclui o sexo, a libertinagem e mais uma vez a ingenuidade (aos olhos deles). Dois autores fizeram essa crítica às avessas sobre um tema que está intimamente ligado a brasileiros e estrangeiros que é a prostituição. Um desses autores é Marcelino Freire na Literatura, e Paulo Caldas no Cinema. Em 2005, Marcelino lança “Contos Negreiros” um livro que descarrega em nossos olhos/ouvidos uma crítica do racismo, da exploração e da pobreza que ainda assola nosso país. Mas existem dois contos no livro que fogem à essa temática da crítica da pobreza e entra numa vertente diferente: a visão do estrangeiro (ainda) tem de nós. No conto “Yamami” um narratário instiga um narrador a contar a respeito das maravilhas que ele encontrou no Brasil, entretanto esse narrador relata que a única maravilha que conseguiu admirar foi o ventre de uma indiazinha que o “guiava” pelas belezas do país. O que fica nítido nesse conto é que a submissão em troca de “favores” percorre toda narrativa, confirmando ainda mais essa eterna condição de colonizados, principalmente em locais mais distantes da urbanização. No mesmo livro Freire discorre sobre dois alemães que vão à “guerra”, mas a guerra não é a tradicional, e sim eles irão “caçar” negrinhas no litoral brasileiro e levá-las à Europa. Fica claro nesses contos de Marcelino Freire que o olhar do europeu filtra o diferente de si, foge do trivial, mesmo que por atitudes ilícitas a busca do prazer se torna uma virtude (deles). Podemos fazer uma comparação intersemiótica com o tema de “Alemães vão à guerra” de Freire com “Deserto feliz” de Paulo Caldas. No filme uma menina de 14 anos se vê perdida numa cidade do interior de Pernambuco, cujo respeito e a moral dos pais estão fazendo com que ela queira esquecer aquele lugar e procurar uma vida mais “digna”, fora dali. Parte então para o Recife, apenas com sonhos e incertezas na bagagem e ao chegar dá de cara com uma realidade que não era a que esperava, via as mesmas cenas que a acompanhava no interior, sexo, malandragem, pessoas sem moral, porém, com uma “vantagem”: ali ela podia ganhar dinheiro com isso. Surge então um “salvador”, um alemão que depois de usá-la a leva para fora do país, ela não se acostuma com outra cultura e se vê perdida, não sabe fazer nada além de vender seu corpo. Tanto no livro como no filme, os autores tentaram passar que, infelizmente, no Brasil ainda existe certo determinismo com relação aos povos mais dependentes, seja economicamente ou culturalmente falando. A possibilidade de sair da situação que a pessoa se encontra parece impossível e a condição de submissão parece imprescindível. E isso pode ser estendido como metáfora na relação do Brasil com outros países, principalmente, no ramo cultural. Enfim, a cultura contemporânea mesmo com a crítica sendo pano de fundo de toda sua forma de expressão, ainda volta a velhos temas relatados no passado, porém a crítica feita nos dias de hoje não tem a cara de chapeuzinho disfarçado de lobo mau, não poupa ninguém, do mais ao menos necessitado, uma parcela de culpa fica a mostra na ponta do iceberg. A atual crítica a forma de os brasileiros enxergarem o mundo é às avessas, tem uma nova roupagem, seja por que meio artístico for, tem olhares voltados para as feridas, mesmo que as machuquem é preciso curá-las.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Transparência Intransponível?

- Foi como?
Eu pensava:
Eu não sei por que saio na sexta-feira. Às vezes fico imaginando que pode ser pelas meninas. Adoro freqüentar lugares estranhos. Mas defina estranho? O lugar só se torna estranho para as pessoas que nunca vão a esses lugares, na segunda vez que aparecem por lá, já são conhecidos dos garçons, as mulheres os chamam por apelidos carinhosos do tipo: grandão, gatinho, delícia, e por aí vai. Penso também que pode ser para espairecer, sair daquele famigerado MSN, do Orkut, parar de escrever poesia no meu blog inútil-quase-nunca-visitado. É... Hoje em dia parece que quando compramos um byte, fazemos um site, e assinamos a velox, cada filigrama de você está sendo usado a serviço da solidão. E ainda dizem que a internet é feita para unir as pessoas. Balela. Acho que em cada pixel da porra daquela tela é uma alma que aquele nerd de tridente roubou de nós. Hoje é assim, cada vez mais as coisas estão diminuindo. Quem é que leva um micro-system para um acampamento? É isso mesmo, ninguém. Todo mundo fica enfiado naquela merda de MP- não-sei-das-quantas. Tudo ficando menor: as coisas, os sentimentos, as pessoas, as frases. Até as frases? Um casal namora assim atualmente, com duas palavras: Já é? Já é. Pronto: Inicia-se uma boda de ouro. É foda. Imagine os netos desse casal na noite de Natal perguntando a eles como eles se conheceram:
-Vovô?
-Diz aí brother.
-Como foi que o senhor conheceu vovó?
-Foi assim... Eu cheguei para ela, estava tocando Aviões do forró, e cheguei para ela e disse: Já é? Ela olhou para mim e disse: Já é. Foi amor à primeira vista.
Patético. Eu sei que isso não é remorso, inveja, solidão, isso não é porra nenhuma, mas o que eu queria mesmo que acontecesse é que do nada... Assim... Na frente de uma banca de revista, alguém me notasse, e dissesse uma palavra que não escuto há muito tempo: oi. E acabasse de vez com essa minha transparência intransponível, para enfim dizer (e aí brother?) na noite de Natal para o meu neto. Mas do jeito que vai isso é só viagem de um cara só. E também eu não sei se daqui a alguns anos vai ter banca de revista, se vai ter menina (as meninas andam de mãos dadas nesses tempos) se vai ter neto. Enfim, vou arrumar um trabalho que é o melhor que eu faço. Era assim.
-E aí como foi?
Eu pensava:
Não faço questão de ir à praia aos domingos, nem de ir tomar uma cerva com os amigos num sábado à noite, o que me importa mesmo é a sexta-feira. Sexta-feira é um dia massa. Massa não por causa das meninas, dos lugares estranhos que freqüento, mas por causa dele. Às vezes acho que estou delirando, desde a infância tenho minha sexualidade definida, e sem medo de nada batia no peito e dizia: Eu gosto de mulher. É... Gosto de mulher. E minha mãe ficaria desapontada se eu não cumprisse -à risca- a tradição familiar. Mas semana passada aquele esbarrão que dei nele virou minha cabeça. Foi de propósito eu sei. E se não fosse daquele jeito? Como seria? Ele não me nota. Sempre de cabeça baixa. Adoro esse jeito dele. Nunca gostei de caras com esse perfil. Magrinho, óculos de armação preta, cabelo lisinho. Não queria dizer, mas vou: Meio EMO. Achava os EMO’S a escória do mundo, depois do esbarrão mudou fácil minha opinião. Que coisa estranha, senti vontade de ter um homem em meus braços, em cima de mim, falando todas aquelas sandices que os atores pornôs falam no ouvido daquelas vagabas. Ele é lindo, porém inacessível tenho que tentar outra coisa. Quem sabe um oi? Que coisa estranha eu gostando de homem? Nunca senti isso, mas tenho que dar a cara à tapa. Sei não, mas quero.
E depois:
Agora deu: Sozinho, liso, desesperado e com outro não na minha coleção de nãos nas entrevistas profissionais. Não. Outro não, não. Pode colocar aí escritor, em caixa alta e em negrito NÃO. Só falta agora virar bicha... É fogo. Mas está todo mundo virando? É foda. Que é isso, pensar em ser bicha já é viagem demais para uma só cabeça desesperada, e além do mais, seria uma decepção não manter – à risca- a tradição familiar: Gostar de mulher. Sabe de uma coisa: Eu preciso de uma mulher... Daquelas... De filme pornô... Falando e sussurrando aquelas cachorradas que elas dizem na cara dos tarados atores. É... Eu preciso de uma mulher, nem que seja de papel. Hum... é foda, nessa idade? Pois é,quem não tem Luana Piovanni caça com Gretchen mesmo. Vou ali à banca.
- Quem é Gretchen?
Decidi:
É hoje. Estou aqui nesse banco há um tempão e nada daquele gostosão passar. Tenho que saber se eu quero isso pra mim mesmo, se é bom, se vou achar estranho, se vou achar gostoso.
Lá vem ele. É agora. Vou lá. Levantei. Fui de encontro a ele.
-E depois?
-Disse oi.
-E ele?
-Já é.
-Foi assim mesmo vovó?
-Foi brother.
-Vamos cantar parabéns papai, afinal não é todo dia, principalmente nos dias de hoje, que alguém completa bodas de ouro.
-Pois é.

Hangner Correia
16/12/09