sábado, 19 de setembro de 2009

“Um eterno não –ser” ?

Distraído, passando por entre canais de televisão, cheio de textos universitários no colo, cá estou eu numa sexta-feira à noite. Quase destruindo o “scroll” do controle remoto, eis que alguma coisa me chamou a atenção. Era uma propaganda de um canal de televisão que ninguém assiste, a não ser quando passa naquele canal que tem um número de azar na configuração. A propaganda terminava com uma frase que a principio nada instigaria, mas por fim terminou sendo pano-de-fundo para esse texto, a frase era a seguinte: “Não são as respostas que movem o mundo, e sim, as perguntas.
Eliminada a distração, fui ao meu caldeirão de interrogações e – assim como tem sido ultimamente- puxei logo para “minha sardinha literária” alguns desses moinhos de vento que movem a orbe. Uma dessas perguntas foi: De que se fala a Literatura contemporânea? Pergunta essa vista em um site de grande circulação na “net”. E a segunda, que pode se desconecta em duas, seria: A sociedade merece a arte que tem, ou a arte é que merece esta sociedade?
Steven Connor em seu livro “Cultura Pós-moderna” diz que o principal alvo filosófico da atualidade é a crítica. E continua afirmando que todos nós diante de alguma manifestação artística, esquecemos como foi nossa recepção ante esta arte e na sequência engatilhamos nossas armas, e descarregamos nossas visões estéticas, sociológicas, políticas e até antropológicas, nessa prosa ou poema, ou seja, atualmente a crítica está acima de nossa percepção estética.
Muitos críticos da atualidade descarregam seu arsenal na cultura contemporânea dizendo que é uma arte artificial, sem regras, desvinculado da forma e que na verdade essa arte não tem a expressividade que possuía em outras épocas. Para a crítica a cultura contemporânea é um eterno não–ser . Ora, compartilho da opinião que a arte é reflexo da sociedade que a possui, é incontestável que a história tem provado isto. Peça a Zola para fazer um livro cujo conflito entre Homem e o Divino seja pano-de-fundo, no mínimo, ele soltaria os verdes vermezinhos que ele tinha no laboratório/escritório do Positivismo dessecando teu braço até sua morte. Sugira a Homero que troque seu herói Ulisses pelo anti-quase-herói Macunaíma, e daí analise como ficaria a sociedade grega. Não podemos exigir forma em uma sociedade totalmente disforme como a nossa, na qual, idosos tiram fotos de crianças recém-nascidas seminuas e espalham pela internet, sem nenhum propósito angelical, onde as estruturas familiares estão desconjuntadas/mudadas, nas quais, a mãe é que é a provedora da família (e às vezes os filhos). Como exigir que não sejamos artificiais se hoje em dia o programa mais assistido é um bando de modelos apolíneos passando fome em uma floresta, e que o papo principal dos adolescentes (do Coque ou de Casa Forte) é a nova música de quaisquer Aventureiros do forró. Enfim, as manifestações literárias atuais estão fazendo o que sempre fizeram, refletindo o pensamento da sociedade vigente.
Pronto: A pessoa que lê esses parágrafos pode pensar que este que vos digita acha tudo que está acontecendo por aí pode ser considerado literário? Minha resposta pode ser sim e não. Minha resposta positiva se baseia em dois pensadores importantes, o primeiro Antônio Cândido, que considera os textos do tempo colonial brasileiro não uma literatura propriamente dita, e sim, manifestações literárias. E o segundo é Nietzsche que afirma que o tempo e a história são cíclicos. Penso na teoria do Crítico literário porque atualmente o valor da literatura está muito ligada à performance, ou seja, artistas pulam do 4º andar de um prédio para expressar seu lado poético, fecham cruzamentos de cidades movimentadíssimas para no final falarem “ ...ser ou não ser, eis a questão...” O que pode estar acontecendo hoje pode ser essas manifestações que fala Antônio Cândido e não propriamente literatura. Por isso o filósofo me veio à cabeça. Como nada (pra ele) é linear essas tais manifestações podem estar acontecendo novamente no Brasil atual da mesma forma que acontecera outrora. Entretanto, não só de espetáculo carnavalesco-literário vivemos hoje, existem escritores que ainda preservam a essência da literatura: Não revelar, sugerir, procurar a palavra certa para a imagem sentida. Mas a crítica com seu olhar lobo mal disfarçado de chapeuzinho, não sei se por preguiça ou oportunismo, ainda não soube enxergar e entender essa nova estética.
Com a velocidade da tecnologia da informação, a arte também não ficou de fora desse banquete e a “blogueteratura” está aí. Muita gente que escrevia e encontrava a barreira burocrática editorial pela frente hoje tem a facilidade de ser lido na Rússia, no Rajastão, nos Estados Unidos ou em Ouricuri.
Isso é bom? Não sei, mas a crítica tem que analisar essa atual conjuntura com cuidado, e não fechar os olhos e desprezar o que está sendo escrito hoje, quem sabe se no meio desse desprezo não surge um Manuel Bandeira, um Graciliano, ou até um imortal, mesmo depois de morto, como Machado de Assis, só que com alguns megabytes a mais.
Bem ou mal “isso” é o que estamos escrevendo hoje, mostrando toda nossa deformidade e refletindo (bem ou mal) nossa visão de mundo e pensamento em relação à condição humana. Nós críticos, temos que tirar mais uma vez o véu da tradição e tentar entender a cultura contemporânea. E se ela é um eterno não-ser, só o tempo dirá a resposta, aliás, não são as perguntas que movem o mundo?